terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Yoani Sánchez e o radicalismo bocó


Yoani Sanchéz: "traidora", "vendida",
"agente dos EUA", mercenázzzzzz...


     A blogueira cubana Yoani Sánchez, que escreve o conhecidíssimo (fora de Cuba) Generación Y, desembarcou ontem no aeroporto de Recife. O Brasil é a primeira parada da blogueira, que passará por uma série de outros países para discutir as questões sobre as quais escreve em seu blog, cujo tema principal é a crítica à realidade cubana.
     A chegada da blogueira, tanto no aeroporto de Recife quanto, mais tarde, no de Salvador, foi marcada por protestos de manifestantes favoráveis ao regime cubano. Yoani foi chamada de "mercenária", "traidora" e "personalidade falsificada", a serviço da CIA e dos EUA, dentre outras coisas.  Em Recife, manifestantes chegaram a puxar o cabelo da blogueira. Ela não apenas não se incomodou com os protestos, como deu uma resposta interessante: "Foi um banho de democracia e pluralidade, estou muito feliz e queria que em meu país pudéssemos expressar opiniões e propostas diferentes com esta liberdade."
     Ontem, em Feira de Santana, seria exibido na Casa do Saber (um planetário cedido pela prefeitura) o documentário "Conexão Cuba Honduras", do cineasta baiano Dado Galvão. Yoani Sánchez, que está no documentário, estava presente. Mas manifestantes invadiram o salão e impediram a exibição. A blogueira teve de ser recolhida a uma sala fechada, de onde só conseguiu sair após mais de vinte tentativas frustradas. Os militantes já avisaram que estão se organizando e que protestos ocorrerão nas demais aparições de Yoani Sánchez em outras cidades.
     É a primeira viagem internacional que a blogueira faz desde 2008, quando, após voltar a Cuba, foi proibida de deixar o país.
    Em política, há poucas situações em que o radicalismo se justifica. Devemos ser absolutamente radicais contra ditaduras, tiranias e governos que violam direitos humanos e fundamentais de seus cidadãos. Devemos ser radicais contra a corrupção, e na exigência de que os poderes públicos se submetam às leis por eles criadas. Não devemos, em hipótese alguma, ser radicais contra pessoas que têm posições políticas diferentes das nossas.
     Yoani Sánchez é severamente criticada por suas posições políticas, e não há nada de errado nisso. Todo argumento é sujeito a críticas - se bem ou mal fundamentadas, é outra questão. Mas o radicalismo que leva um grupo de manifestantes a impedir a exibição de um filme e a agredir fisicamente alguém de cujas ideias discordam é o reflexo mais evidente de uma intolerância inaceitável em regimes democráticos (pergunto-me como essas pessoas agiriam se estivessem no poder).
     Critica-se o fato de Yoani Sánchez receber um um salário da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa) e ter um padrão de vida superior ao dos demais cubanos - como se essa situação lhe impedisse de discutir o que quer que ela queira discutir em seu blog. Chamam-na de traidora - mas traidora de quê ou de quem? Afirma-se que ela serve a interesses dos EUA. Talvez sirva, talvez não. Se servir, é direito dela fazê-lo. É direito dela, inclusive, adorar os EUA e considerá-los o Éden na Terra - e assim se manifestar, se achar que deve. Acusam-na de promover desinformação. Mas não sei se seus críticos conhecem a realidade cubana tão bem - ou ao menos tão bem quanto ela, que mora lá - para fazer essa afirmação com tamanha certeza. E não nos esqueçamos de que "faturar o que é bom e esconder o que é ruim" (nas palavras imortalizadas por Rubens Ricupero em 1994, no famoso "escândalo da parabólica") é a estratégia de grande parte dos militantes políticos, tanto de esquerda quanto de direita. Sem contar que a desinformação é uma arma política usada por todos os regimes socialistas (Cuba, inclusive). Pelos capitalistas também, é claro, mas nenhum capitalista está acusando Yoani Sánchez de promover desinformação.
     Em suma, sejam bem ou mal formuladas (a maioria me parece bem tola, mas há vários questionamentos válidos e consistentes), as críticas à blogueira fazem parte do universo das ideias, e é assim que as coisas devem ser. Mas um radicalismo bocó, com agressões físicas e tentativas de impedir a exibição de filmes, não tem nenhuma utilidade, política ou ideológica. É só mais munição para o pensamento conservador que liga, automaticamente, o pensamento de esquerda ao autoritarismo. Ou seja, é burrice.
     E convenhamos, Yoani Sánchez não merece tudo isso. Embora seja um produto de marketing perfeito para a pós-modernidade (a moça de ar frágil que se ergue intrépida contra o governo tirano e malvado), embora seja uma celebridade mundial, seus textos não têm essa relevância toda. Alguns são interessantes, e só. Não passa muito disso. O radicalismo bocó, nesse sentido, lhe dá um ibope que seu blog, por si só, não sustentaria. Mais um ponto para ela.
     De resto, se você não gosta de Yoani Sánchez, ignore-a. Deixe-a escrever seus textos, fazer seus discursos e suas viagens (aliás, o simples fato - solenemente ignorado por seus detratores - de ela ter sido proibida pelo governo cubano de deixar o país por quatro anos já justifica algumas de suas críticas). Critique suas ideias (mas não precisa puxar seus cabelos), aponte suas incoerências e mostre, de forma racional e democrática, no que ela está errada.
     Também seria interessante que os críticos mais ferrenhos da blogueira passassem alguns anos em Cuba, sem acesso à internet, sem poder criticar o governo, sem poder deixar o país e sem encontrar livros que o governo considera inadequados à população, dentre inúmeras outras restrições (sempre achei curioso o fato de que celebridades que defendem o regime cubano, como Chico Buarque, Niemeyer e Saramago, nunca se dispuseram a abandonar seus próprios países para viver a utopia socialista na própria pele). Alguém que conhecesse essa realidade de perto poderia, com mais propriedade, defender as vantagens do regime - caso não mudasse de ideia.

4 comentários:

  1. Me parece pertinente a citação de Voltaire:

    "Eu discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo"

    Muito embora a o direito de discordar seja essencial à democracia, nesse caso concordo em gênero, número e grau com o blogueiro!

    O - sempre - Anônimo

    ResponderExcluir
  2. Não me associo com os radicalismos apresentandos, bem como é de se repelir atitudes como estas, precisamos de bom senso para discutirmos, concordarmos ou não, é vital em um Estado Democrático de Direito.

    Por outro lado, bem debaixo dos nossos narizes reina um sistema que monopoliza a informação, e transforma os meios de comunicação em uma ditadura, vejamos a Folha de S. Paulo que acionou o Judiciário para tirar do ar o site "Falha de S. Paulo, qual é o problema com a liberdade de expressão aí? O mesmo jornal que defende com unhas e dentes a blogueira. Não estou referendando o sistema que vigora em Cuba, que fique claro.

    Ademais, nesse site: http://www.viomundo.com.br/entrevistas/salim-lamrani-um-bate-papo-com-yoani-sanchez.html - tem uma entrevista de Salim Lamrani que demonstra como a "fantoche" conhece bem o seu país. Até quando as informações serão contadas pela metade.

    Gosto desse Reggae que conta exatamente o que acontece em nossos dias atuais.

    Na infância você chora, te colocam em frente da TV
    Trocando as suas raízes por um modo artificial de se viver.
    Ninguém questiona mais nada, os homens do "poder" agora contam sua piada
    Onde só eles acham graça, abandonando o povo na desgraça
    Vidrados na tv, perdendo tempo em vão

    Ditadura da televisão, ditando as regras, contaminando a nação!

    O interesse dos "grandes" é imposto de forma sutil
    Fazendo o pensamento do povo se resumir a algo imbecil:
    Fofocas, ofensas, pornografias
    Pornografias, ofensas, fofocas
    Futilidades ao longo da programação

    Ditadura da televisão, ditando as regras, contaminando a nação!

    Numa manhã de Sol, ao ver a luz
    Você percebe que o seu papel é resistir, não é?
    Mas o sistema é quem constrói as arapucas
    E você está prestes a cair
    Da infância a velhice, modo artificial de se viver
    Alienação, ainda vivemos aquela velha escravidão.

    Ditadura da televisão, ditando as regras, contaminando a nação!

    Abraços.
    Lucas

    ResponderExcluir
  3. Lucas, você está querendo me dizer que em Cuba tem liberdade de expressão???? Nós só acreditamos que não tem por causa do tal monopólio da mídia no Brasil???? rsrsrsrs

    Em que planeta você vive????

    ResponderExcluir
  4. Eu acho um verdadeiro ABSURDO que, no atual estágio de evolução da democracia e das liberdades individuais, ainda tenha gente que defenda ditaduras por motivos ideológicos! Ditadura É UM MAL ABSOLUTO - seja de direita, centro, esquerda ou a pqp!!!

    ResponderExcluir